Suponha
que tramite perante a Câmara dos Deputados Proposta de Emenda à Constituição da
República estabelecendo a obrigatoriedade de Estados, Municípios e Distrito
Federal indexarem a remuneração de seus servidores públicos de acordo com o
salário mínimo.
Considerando
a situação hipotética, analise os itens a seguir, empregando os argumentos
jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso:
a) a
constitucionalidade da referida PEC; (Valor: 0,6)
b) a
possibilidade de provimento jurisdicional que avalie a constitucionalidade da
PEC ainda no curso do processo legislativo. (Valor: 0,65)
RESPOSTA:
A) A proposta de Emenda Constitucional pode ser plenamente objeto
de Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADIn. Quanto a isso não há dúvidas.
O cerne da questão reside na suspeita de os direitos sociais
estarem ou não contemplados no rol das cláusulas pétreas.
A vedação da vinculação do salário mínimo para qualquer fim,
previsto no art. 7º, IV, da CF/88, é um direito social, conforme visão
topográfica do referido artigo, inserido no capítulo dos direitos sociais.
Ocorre que o art. 60, § 4º, IV, contempla como cláusula pétrea tão somente a
expressão “direitos e garantias individuais”, deduzindo-se estar de fora os
direitos fundamentais sociais, por tocarem à coletividade.
O debate na doutrina é tormentoso. Numa interpretação
restritiva das cláusulas pétreas, realmente a proposta de Emenda Constitucional
estabelecendo a obrigatoriedade de Estados, Municípios e Distrito Federal
indexarem a remuneração de seus servidores públicos de acordo com o salário
mínimo seria constitucional, pois revogaria a disposição contrária prevista do
art. 7º, IV, sob o amparo do brocardo “lei posterior derroga lei anterior”.
Todavia, seguindo a corrente da unicidade de regime jurídico
para os direitos fundamentais individuais e sociais (direitos fundamentais de
1ª e 2ª dimensões, respectivamente), a PEC padeceria de vício de
constitucionalidade. Isso porque os direitos fundamentais são universais,
indivisíveis e interdependentes, não sendo possível cogitar a existência de hierarquia
entre os direitos civis, políticos e sociais. Nesse passo, com fundamento no
princípio da máxima efetividade dos direitos fundamentais (sociais e
individuais), previsto no art. 5º, §1º, e, ainda mais, com amparo no princípio
da dignidade da pessoa humana, norteador de todo o ordenamento jurídico, os
direitos sociais constituem cláusulas pétreas. Assim, como a medida a ser
adotada com o futuro emprego da EC não apenas mitiga como abole o próprio direito
social de vedação à vinculação do salário mínimo para qualquer fim, a futura
norma, uma vez aprovada, violaria a Constituição.
Ademais, por apego à argumentação, como o salário mínimo sofre
reajustes periódicos, a indexação forçaria o aumento em cascata da remuneração
dos servidores públicos, afetando negativamente os cofres públicos. Daí surge
como forte o argumento da cláusula da reserva do possível como defesa da
estabilidade da ordem econômica do Estado.
B) Sobre a possibilidade de controle jurisdicional prévio de
constitucionalidade da PEC, ainda no decorrer do processo legislativo, a
resposta seria positiva e se daria por intermédio de ajuizamento de mandado de
segurança, por parlamentar, perante o STF. O fundamento do remédio
constitucional seria o direito líquido e certo dos membros das Casas
parlamentares de participar de um processo legislativo idôneo, íntegro que, no
caso, foi viciado por força de uma PEC de constitucionalidade contestável, por ferir cláusula pétrea.
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