sexta-feira, 18 de março de 2016

O Poder Judiciário pode suspender a nomeação e posse de Ministro de Estado? De quem é a competência?


 A Presidente da República nomeou Luiz Inácio “Lula” da Silva como novo Ministro da Casa Civil, dando-lhe posse no dia 16/03/2016. Todavia, diversas Ações Populares foram ajuizadas por todo o país visando a anular a nomeação, tendo alguns juízes federais de regiões diferentes concedido a liminar para suspender o ato praticado pela Chefe do Poder Executivo Federal. Consequentemente, enquanto perdurarem os efeitos da decisão precária de Primeiro Grau, Lula ficará afastado de exercer as funções do cargo no Palácio do Planalto.
Em primeiro lugar, deve-se indagar: a Justiça Federal é competente para apreciar a matéria?

A competência da Justiça Federal é firmada em razão da pessoa ou da matéria, e está disciplinada no art. 109 da Constituição da República de 1988. O inciso I do dispositivo citado afirma ser da competência da Justiça Comum Federal processar e julgar as causas em que a União for interessada na condição de autora, ré, assistente ou opoente. No caso em tela, a União ocupa o polo passivo da demanda, uma vez que a ação popular ajuizada visa a desconstituir ato lesivo ao patrimônio público, causado pela Presidente da República (art. 1º da Lei n. 4.717/65). Esta simples constatação já é suficiente para firmar a competência na Justiça Federal.
Entretanto, vozes doutrinárias afirmam que a competência seria do Supremo Tribunal Federal, ao argumento de que a revisão de atos da Presidente da República não poderia ficar a cargo de um juiz de primeira instância.
Esta corrente não parece ser a mais acertada. O julgamento originário por atos atribuídos ao Chefe do Poder Executivo Federal, dentre outras autoridades, pela Suprema Corte está restrito às hipóteses de foro por prerrogativa de função pela prática de crimes comuns (interessante lembrar que o próprio STF entende que seus próprios Ministros e os de Estado têm foro especial para a apuração de atos de improbidade administrativa). Apenas uma tese mirabolante a ser criada pela mais alta corte nacional poderá superar essa regra de competência absoluta.
Outra indagação diz respeito à possibilidade de controle judicial do ato de nomeação de Ministro de Estado pela Presidente da República.
De acordo com a classificação dos agentes públicos, os Ministros de Estado são enquadrados como agentes políticos, por ocuparem a mais alta cúpula do Poder Executivo, e serem responsáveis pela direção política da Administração Direta Federal. Todavia, esta qualificação jurídica não é suficiente para retirar este ato da esfera administrativa para alça-lo como ato de governo.
O Direito Administrativo, conforme o critério da Administração Pública idealizado por Hely Lopes Meirelles, “é um conjunto harmônio de regras e princípios que regem os agentes, órgãos e entidades públicas, desde que exerçam atividade administrativa, realizando, de forma direta, concreta e imediata, os fins desejados pelo Estado”.
Para se chegar ao fim almejado pelo Estado, deve-se atentar ao sistema de governo adotado. A república significa governo de todos, sendo este o motivo para o parágrafo único do art. 1º da Constituição Cidadã prever que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Consagra-se a democracia participativa, dotando o povo de instrumentos de participação direta na formação da opinião política do Estado (referendo, plebiscito, ação popular, iniciativa popular de lei), bem como dispondo de mecanismos de representatividade (eleição).
Em razão do sistema republicano de governo, o administrador, por ser gestor da coisa pública, tem sua atuação limitada pelo princípio da indisponibilidade do interesse público, ou seja, seu proceder somente será válido se tiver como objetivo satisfazer o interesse público primário, que corresponde aos anseios do povo.
A nomeação de Luiz Inácio “Lula” da Silva ao cargo político de Ministro de Estado tem indubitável interesse pessoal, qual seja, a de atribuir foro por prerrogativa de função ao investigado pela operação Lava Jato, presidida pela Polícia Federal. Esta deturpação do ato administrativo torna inválido o requisito finalidade, que corresponde à satisfação do interesse público primário. Assim, por se tratar de um requisito vinculado, ou seja, adstrito ao exame da legalidade, é plenamente justificável a revisão do ato pelo Poder Judiciário para suspendê-lo liminarmente para, posteriormente, consagradas as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa, prolatar sentença reconhecendo a nulidade absoluta e desconstituindo o ato de nomeação, por desrespeito ao requisito da finalidade.
Toda esta exposição corresponde a pensamento pessoal, não servindo como uma tentativa de adivinhação do posicionamento do Supremo Tribunal Federal. Apenas o tempo dirá qual será o resultado da contenda judicial, mas se aguarda, com esperança em dias melhores, por um pronunciamento semelhante. 

Um comentário:

  1. Para dar um suporte jurisprudencial, interessante observar o pronunciamento do Supremo Tribunal Federal sobre o assunto:
    “O STF não possui competência originária para processar e julgar ação popular, ainda que ajuizada contra atos e/ou omissões do Presidente da República. A competência para julgar ação popular contra ato de qualquer autoridade, até mesmo do Presidente da República, é, via de regra, do juízo de 1º grau”. (STF. Plenário. Pet 5856 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 25/11/2015 (Info 811)

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